segunda-feira, 30 de abril de 2012

Casos de assédio - Trabalho escravo: compra de produtos em troca de salário

Por mais absurdo que possa parecer, há empresas que só contratam pessoas que se submetem a condições abusivas, como o desconto de parte do salário que será pago.  Ou seja, a empresa toma parte do salário do empregado.

Explica-se com um caso prático:  Umas empresas em Brasília estão sob investigação do Ministério Público do Trabalho, em decorrência de ação trabalhista movida por ex-empregado.

Na ação, a Justiça reconheceu que o ex-empregado foi coagido a comprar produtos comercializados pelas ex-empregadoras.  Isso se deu, sob pena de demissão.  Ou seja, ou o ex-empregado comprava os produtos, ou ele seria demitido.

Por não concordar com os descontos indevidos em seu salário, assim como outros abusos, o empregado passou a questionar as empresas.   
A consequência lógica foi a demissão do empregado.  Mas, como toda demissão abusiva, se deu sem justa causa.

O agora ex-empregado entrou na Justiça e ganhou o reconhecimento do fato alegado.

(Detalhe: as empresas processadas, apesar de terem advogados empregados, tiveram que recorrer à contratação de caro escritório de advocacia de Brasília.  Tratou-se de uma clara tentativa de abafar o caso, para que os outros empregados das empresas (mais de 1200), inclusive os advogados empregados, não tomassem conhecimento de seus direitos.  
Tentaram, até, pedir segredo.  O que foi negado pela Justiça.)

Na sentença, a Justiça inclusive mandou que fosse enviada cópia para o Ministério Público do Trabalho, para instaurar inquérito e apurar os fatos, já que havia graves indícios de que isso se passa com os demais funcionários.

Seguem alguns trechos da sentença.  Os nomes foram abreviados e/ou trocados pelos cargos das pessoas citadas pela sentença):

...que como chefe a depoente era obrigada a cobrar do reclamante a compra de produtos sob pena de não ser mantido mais no emprego; que o reclamante teria que comprar seguro, poupança salário e todos os produtos disponíveis aos empregados que não tivessem contratado; que o vice-presidente da terceira reclamada, Gen. B. (vice-presidente), era quem ordenava à reclamante a fazer tais cobranças; que sistematicamente a depoente era cobrada acerca da adesão dos empregados de seu setor a tais produtos e cobrava dos empregados no mesmo sentido; que chefe era a mesma coisa que gerente; que existem dois seguros na reclamada, FAM - Fundo de Apoio à Moradia - e Decessos, destinado a funerais; que o general chegava com uma relação de empregados que não haviam aderido a tais produtos e a depoente cobrava de todos; que com certeza, se recebeu tal ordem do general, cobrou da funcionária T. (ex-advogada da Cojur) e de todos os outros; que esse general também era vice-presidente da primeira reclamada; que o general não compõe a diretoria da segunda reclamada, P. (empresa de previdência); que a influência que o general tem na segunda reclamada é decorrente do fato da primeira reclamada ser patrocinadora da segunda, sendo que a primeira indica a diretoria da segunda;  (...)


Restou comprovado pela testemunha do reclamante, Sra. D., que o autor foi cobrado por ela, sua então chefe, a comprar produtos da reclamada, sob pena de demissão. A própria testemunha fazia essa cobrança a mando do vice-presidente da primeira reclamada. Tal fato também foi confirmado pela testemunha Milene que presenciou a Sra. D. fazendo a cobrança ao reclamante.  (...)
 
O documento de fl. 534 comprova que o vice presidente tinha relação de empregados que não aderiram aos produtos das reclamadas e pediu explicações, aduzindo que tais empregados não estavam em consonância com os objetivos da empresa, ou seja, não vestiram a camisa da empresa. O documento é de 15/03/2010.  
Comprovados os fatos relatados na exordial, desnecessária a exibição de mais documentos, conforme requerido.  (...)

Constam dos autos às fls. 75 a 79 que o reclamante recebeu cartas de recomendações e elogios de Ministros do TST, STJ, conselheiros da OAB, e membro do MPU para realizar mestrado na Universidade de Madri. Consta dos autos que o reclamante já foi professor. Os e-mails de fls. 366 a 370 demonstram que o reclamante sabia se defender, tendo coragem para fazer críticas diretas a sua chefe, Sra. B. C. da S. (gerente da Cojur). Desta feita, patente que o reclamante não era hipossuficiente que ficou “entre a faca e a foice”, como alegou.   (...)

Resta claro que o reclamante foi pressionado e por fim resolveu aderir aos produtos da reclamada. Contudo, tal pressão não se configura coação passível de anular negócios jurídicos dadas as condições pessoais e de personalidade do autor.   (...)

Tendo em vista o documento de fl. 534, oficie-se o MPT, como cópia do documento e da sentença.  

A sentença, apesar de elogiar a conduta do ex-empregado, foi contrária à lei em alguns pontos.  É que a lei não distingue religião, sexo, idade, nem classe social do cidadão.  Mas a sentença transcrita o fez, em relação ao reclamante (ex-empregado).  É o que aconteceu quando a sentença falou dadas as condições pessoais e de personalidade do autor.

Todos devem ser tratados como iguais, não importa de onde venham.  Não se pode tratar cidadãos de forma diferente, por causa de condições pessoais.  Por isso, esse fundamento foi atacado por meio de recurso.

Mas houve o pleno e cabal reconhecimento de que a empresa forçava os empregados a contratar os produtos.  Essa é a ilegalidade que o reclamante queria ver reconhecida e que nenhum outro ex-empregado tinha conseguido provar, até então.  Apesar da redação da sentença, houve, tecnicamente, um ganho parcial e que ensejou a intervenção do Ministério Público do Trabalho.

A situação narrada configura evidente caso de assédio moral, pois esse abuso de poder das empresas fere a dignidade do trabalhador.
De nada adiantaria uma empresa pagar R$5000,00 de salário, se ela te toma R$1000,00 por mês, a título de prestação dos serviços (sob pena de demissão), por exemplo.  Isso, além de abuso, constitui uma quebra do contrato de trabalho e enseja a rescisão indireta do mesmo.  Em outras palavras, o empregado lesado garante todos os seus direitos.

Esse tipo de conduta assediadora da moral é comum em empresas do ramo financeiro, principalmente.  O que mais impressiona, é o total descaso com a lei e a moral dos empregados.

A sentença originou um Inquérito Civil, no Ministério Público do Trabalho.  Agora, as empresas estão sob investigação.

Fala-se que não existe mais trabalho escravo, ou que o trabalho escravo está praticamente abolido.  

Fatos como esses são prova de que ainda há trabalho escravo, no Brasil.  A  chibata de antigamente é a subtração de parte do salário e da dignidade do trabalhador de hoje, por meio de coação.

Cartilha sobre Assédio Moral - Ministério Público do Trabalho

Segue uma cartilha didática, sobre os aspectos do assédio moral: http://www.prt10.mpt.gov.br/.



Na coluna da esquerda, onde consta "Serviços ao cidadão", há a opção Cartilha sobre assédio moral.

O que chama bem a atenção é, no perfil do agressor, as características: inseguro, complexado e intolerante.  

Há aqueles chefes que se sentem ameaçados por subordinados mais capacitados, o que é prova clara da insegurança, muitas vezes decorrente da imaturidade daquele que ocupa o lugar de líder, mas não lidera nada e ninguém.

Como o advogado autor deste blog já presenciou ambientes de assédio moral, reconheceu claramente essas qualidades.

Vejam que um dos motivos clássicos do assédio moral é forçar a demissão do empregado.

Como a corda sempre arrebenta no lado do mais fraco (o trabalhador), a sugestão é colher provas do assédio moral (a cartilha indica meios interessantes para isso) e requerer (sempre por meio de documento escrito e com o carimbo de recebido pelo setor de pessoal) a rescisão indireta do contrato de trabalho.

Afinal, a saúde do empregado assediado é mais importante do que alguns meses a mais de salário.  Se o empregado tentar resistir demais, acabará gastando os salários em despesas médicas de custo elevado.  O que não vale a pena, principalmente porque saúde não tem preço.

Assédio moral, como diz a cartilha, é sinônimo de humilhação!   Respeitem-se e busquem seus direitos!